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CNTE/Brasil: Após anos de retrocesso…

«Eu fales com o juiz: ‘você acabou de assinar minha certidão de óbito. Ali acabou meu chão, acabou minha vida. Com essas palavras, a mineira Paola Pereira, 40, deixou o julgamento do ex-marido, por tentativa de feminicidio, em 16 de março de 2018. Segundo ela, depois de tentar tirar a vida da esposa e das filhas explodindo um botijão de gás, ele não passou sequer um dia preso. «O jurz falou comigo que ninguém mata ninguém com botijão de gás e um isqueiro, e que não era uma tentativa de homicidio. O que eu tenho é só esse papel, essa medida protetiva que o juiz me deu».

Paola afirma que o ex-companheiro não respeita a determinação de afastamento. Ela diz que há cinco anos recebe ameaças e se muda constantemente de cidade, dentro do Estado de Minas Gerias, para proteger a familia. «Dentro da delegacia da mulher, em Contagem (MG), o policial falou comigo que eu gostava de apanhar e que estava dando trabalho a eles.»

O Ministério Público de Minas Gerais ofereceu uma opção a ela. «Fizeram uma proposta de me tirar do Estado, e mudar minha identidade. Não tinha como eu aceitar, porque só minhas filhas mais novas poderiam ir comigo», conta Paola. Mãe de quatro filhas, ela diz que, no Sistema Único de Saúde, foi disponibilizado acompanhamento psicológico apenas para ela, não se estendendo as meninas.

«Consequência do retrocesso dos últimos 6 anos»

A história de Paola ilustra o retrocesso nas políticas públicas de combate à violência contra a mulher. Segundo o Anuário Brasileiro de Segurança Pública, o número de casos de feminicidio no Brasil cresceu 6,1% em 2022, nun total de 1.437 mulheres mortas. Os acionamentos ao 190, número de emergência da Policia Militar, chegaram a 899.485 ligações, o que significa uma média de 102 acionamentos por hora.

De acordo com o relatóno, o desfinanciamento das politicas de proteção à mulher é um dos principais motivos para o problema. No periodo (2018 a 2021), foi destinado o menor recurso, em uma década, para as ações de enfrentamento aos crimes de misoginia. A verba destinada caiu de R$100,7 milhões em 2020, para R$9,1 milhões, em 2021. A justificativa para a redução foi a adoção de ‘políticas transversais, que englobariam diversas áreas de promoção dos direitos humanos, ao mesmo tempo.

Além disso, medidas como a flexibilização do porte de armas são apontadas por especialistas como fatores agravantes da violência contra as mulheres. Mais de um milhão de novas armas entraram em circulação, segundo dados do Anuário Brasileiro da Segurança Pública, publicado em junho de 2022.

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A cientista política Marlise Matos, coordenadora do Núcleo de Estudos e Pesquisas Sobre a Mulher (Nepem) da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), afirma que, numa sociedade profundamente marcada pela cultura patriarcal, como a brasileira, a liberação do uso de armas coloca as mulheres em uma situação de risco ainda maior. «A flexibilização aumenta o número de crimes com uso de armas de fogo, especialmente no ambiente doméstico. Esse é um fenômeno já identificado no mundo todo».

Os discursos de odio contra as mulheres também se tornaram mais frequentes. Segundo uma pesquisa feita pela em 2022 pela Central Nacional de Denúncias da Safernet, ONG brasileira de proteção aos Direitos Humanos no ambiente digital, no primeiro ano, o número de casos de ataques por misoginia aumentou 1639,5%. Denúncias de racismo e de xenofobia registraram aumento de 595,5% е 262%, respectivamente.

Marlise Matos frisa que, apesar de não se poder fazer uma relação de causalidade estrita, o contexto de autorização pública da violência estimulou o incremento das formas de agressão contra as mulheres. «Quando você tem um govemante máximo, o presidente de um pais, fazendo discursos misóginos absurdos, isso dispara os gatilhos para que outros homens se sintam desresponsabilizados por usar a violência

A cientista acrescenta ainda que o aumento da violência se da como consequência do retrocesso dos últimos 6 anos. «Tivemos, num contexto de pandemia, homens que se viram ameaçados pelo avanço das mulheres. Além disso, um governo que desfinanciou ações de enfrentamento à violência e, ainda, estimulou a misoginia. A gente está vendo o resultado dessa estrutura extremamente perversa.

«Já escapei da morte várias vezes

A professora Maria da Penha e Silva, 46, saiu da propria casa, na comunidade quilombola de Conceição das Choulas, distrito de Salgueiro (PE), para morar de aluguel, depois que as ameaças do ex companheiro se tornaran frequentes. Já estávamos separados, mas ele insistia em voltar a morar comigo. Um dia, eu estava trabalhando, na escola, e ele foi até ao local do meu trabalho dizendo que quena entrar na casa. Nesse mesmo dia, eu lever meus filhos para outro lugar».

Enquanto estavam juntos, por oito anos, Mana lembra-se de ter escapado da morte diversas vezes e diz ter sofrido todos os tipos de agressão. «Ele é usuário de drogas e bebe muito. Meu maior medo era de que alguém viesse fazer alguma coisa com meus filhos. Passava noites sem dormir»,

Assim como Maria da Penha, em 2022, mais mulheres sofreram violência dentro de casa. Segundo o Anuano Brasileiro de Segurança Pública, houve um aumento de quase 3% no número de agressides em contexto doméstico. Foram 245.713 registros. A quantidade de ameaças aumentou 7,2%, resultando em 613.529 casos. Todos os dias, aproximadamente 670 mulheres foram até uma delegacia para denunciar um episódio de violência no lar.

Na justiça, Maria da Penha teve acesso a uma medida protetiva. Ainda assim, ela vive com medo do descumprimento da Lei, e de ser vitima de novos ataques. «Tenho medo de ele aparecer a qualquer momento».

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Segundo especialistas, é assim que vive a maioria das vitimas de violência doméstica no Brasil. Para a promotora de Justiça do Ministério Público de São Paulo (MPSP), Valéria Scarance, autora do livro «Lei Maria da Penha», o Brasil está longe de oferecer a segurança necessária para que as mulheres possam viver em paz. Segundo ela, a punição para os crimes de misognia é considerada incompatível com a gravidade do problema. «São inúmeros os inquéritos e processos em que ocorre a prescrição. As penas por crimes graves como a ameaça são infimas, de poucos meses», afirma.

Por outro lado, a promotora ressalta a importância de mudanças recentes, como a conscientização popular quanto às diversas formas de violência, a criação de serviços especializados em todos os Estados, o pagamento de pensão especial para órfãos dos feminicidios e alterações legislativas, como no caso da Lei Maria da Penha, de 2006, «Agora as medidas protetivas podem ser estendidas nos dependentes da mulher em situação de violencia, não dependem do registro de boletim de ocorrência, nem da existência de um processo cavil ou criminal. Elas ficam condicionadas apenas à existência de perigo, ainda que o inquérito seja arquivado, ou o réu absolvido por falta de provas», explica.

Uma das maiores conquistas no campo do direito das mulheres, em 2023, for a inconstitucionalidade do uso da tese da legitima defesa da honra em casos de feminicidio. Em agosto, a proposta foi aceita, por unanimidade, no Supremo Tribunal Federal. Também foi criada a Campanha ‘Brasil sem Misoginia que busca mobilizar a sededade para mudanças de comportamento, em prol da segurança das mulheres.

Em casos como o de Paola Pereira, nos quais haja descumprimento da medida protetiva, o programa ‘Casa da Mulher Brasileira pode servir como alternativa. Por meio dele, mulheres encontram teto e proteção. Inaugurado em 2015, em Campo Grande (MS), o projeto teve o financiamento ampliado. Até 2026, a expectativa é que haja pelo menos 40 espaços de acolhimento e acompanhamento de vibimas de violência doméstica. Atualmente, existem oito: em Campo Grande (MS), Curitiba (PR), Fortaleza (CE), São Paulo (SP), Boa Vista (RR), São Luis (MA), Salvader (BA) e Ceilândia (DF).

«O juiz falou comigo que ninguém mata ninguém com botijão de gás e um isqueiro, e que não era uma tentativa de homicidio»

Para que mais diretos sejam garantidos, Valéria Scarance ressalta que, além de investimentos em espaços de proteçilo, e de iniciativas que facilitem e equilibrem as modos de punição aos criminosos, é preciso incentivar a prevenção à violência. Ela ota o exemplo dos projetos de recuperação dos agressores. «Muitos autores de violência que participam de programas específicos não reincidem», explica

A Ouvidona da Mulher, pensada e instituida no Conselho Nacional de Justiça, se insere na agenda afirmativa da igualdade de género e de raça expressa nas politicas públicas construidas no ambito do Poder Judiciário. Em 2023, o canal de atendimento da Ouvidoria Nacional da Mulher recebeu, até novembro, 349 manifestações.

Para a Ministra do Tribunal Superior do Trabalho (TST), e Ouvidora Nacional da Mulher, Maria Helena Mallmann, as mulheres estão passando a confiar mais nos canais de denúncia, mas ainda há muito o que ser feito. «Ao acolher cidadãos e cidadás, encaminhamos seus depoimentos e arquivamos dados, com o objetivo de contribuir na formulação das politicas institucionais, bem como de discutir e implementar ideias sobre novas formas de proteção e aumento da eficácia daquelas já existentes», explica.

«Recomeço»

Adriana Caeiro, vitima de violência doméstica, se tomou uma ativista pelos direitos das mulheres e escreveu o livro «Parece amor, mas é abuso. Nele, a terapeuta fala sobre a importância da conscientização. Ela explica que faltam politicas de educação que possam ajudar meninas e mulheres a reconhecer a estrutura machista patriarcal. «Já devenam ser feitas palestras sobre os tipos de abuso, os tipos de manipulação, para adolescentes, nas escolas. Inclusive, isso é uma coisa que eu tentei fazer e não consegui. Me falaram que é um assunto muito pesado.»

A escritora diz que, enquanto vivia o relacionamento abusivo, a compreensão foi possivel a partir da leitura de uma publicação no Facebook. «Era um post dizendo assim: «O manual do relacionamento abusivo. Se ele tinha 10 slides, eu vivia 12. Conforme eu fur lendo, fui me identificando e, então, eu encontrei o nome do que eu vivia»

Foram 16 anos de abusos e agressões. Adriana conta que sofreu violência patrimonial, psicológica e fisica. «Eu fiquei com o olho roxo e ele fez um jogo de manipulação comigo. Ele me levou à delegacia para denuncia-lo. Porém, chegando lá, ele disse que me amava, mas entenderia se eu registrasse a ocorrência. No fim das contas, eu achei que era culpada e o perdoei».

Apesar das dificuldades e da longa duração da jornada, após quebrar o cido de violências, ainda há otimismo e esperança. «A gente acha que não vamos viver sem aquela pessoa, de tanta dependència emocional», afirma Adriana. «Então eu sempre afirmo que ha vida feliz após o abuso. Essa pessoa que agora não vẽ saída, ela vai conseguir também. Que ela tenha fé, esperança e coragem».

Depois de se livrar dos abusos, que duraram 13 anos, Paola encontra nas filhas a força para seguir em frente. «Eu tô conseguindo sobreviver. Deus é mais. Minha menina agora vai se formar, no ensino médio. Tô super feliz, sabe? Estou conseguindo criar as minhas filhas com muita dignidade».

Respostas

Sobre as denúncias de Paola Pereira, o juiz disse que o acusado ficou preso cautelarmente por quase três meses, em fato classificado como tentativa de homicidio. Posteriormente, o magistrado afirma que acatou a decisão da promotoria, que alegou desclassificação do crime por falta de provas. O Tribunal de Justiça de Minas Gerais afirmou que não comenta decisões judiciais.

A Policia Ovil de Minas Gerais não respondeu diretamente à denúncia de mau atendimento sofrido por Paola na delegacia de Contagem. Informou apenas que prioriza o acolhimento qualificado e humanizado as mulheres vítimas de violência nas 69 delegacias de atendimento especializado do Estado de Minas Geraus

Quanta ao protocolo de atendimento e a acolhimento oferecido pelo SUS em casos de agressão doméstica (fisica e psicológica), a Secretaria de Estado de Saúde de Minas Gerais informou que está em construçilo, junto ao Ministério do Estado, uma Nota Técnica Onentadora e Fluxo Geral de Atendimento ás Vitimas. O documento deverá ser aprovado na Comissão Intergestores Bipartite (CIB) do SUS-MG, instancia deliberativa que reúne representantes do Estado e dos Municipios

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«Quando você tem um governante máximo, o presidente de um pais, fazendo discursos misoginos absurdes, isso dispara os gatilhos para que outros homens se sintam desresponsabilizados por usar a violência

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Em entrevista à Revista Mátria, Ministra de Estado das Mulheres, Cida Gonçalves, lembra que as escolas precisam ser ambientes seguros para que meninas e meninos aprendam a reconhecer violações

Revista Mátria (RM) Quais ações o Ministério das Mulheres pretende implementar para inibir a violència contra as mulheres no Brasil?

Cida Gonçalves (CG) A raiz do problema é a misoginia, que é a ódio contra as mulheres.. Um outro ponto importante é que a mobilização «Brasil sem Misoginia faz parte de um conjunto de ações que tenos realizado no Ministério das Mulheres. Em março de 2023, retomamos o Programa Mulher Viver sem Violencia, que havia sido suspense nos últimos seis anos. No âmbito deste programa, anunciamos a implementação de 40 ‘Casas da Mulher Brasileira, a reestruturação da Ligue 1180 Central de Atendimento à Mulher, unidades de atendimento móvel para mulheres do campo e da floresta e outras ações que contemplłem a diversidade cultural e a dinâmica territorial das mulheres brasileiras

Em agosto, também lançamos o ‘Pacto Nacional de Prevenção aos Ferminicidios, uma iniciativa com ações estratégicas e formativas para uma mudança estrutural da sociedade. O Ministerno das Mulheres coordena a Comité Gestor do Pacto, que resine 10 minntérios e a Casa Civil para formular, implementar, monitorar e avaliar ações governamentais de prevenção aos feminicidios

Temos, ainds, fortalecido o relacionamento com as secretarias de Mulheres estaduais e municipais e temas investido em cursos de formação para órgãos governamentais e para a sociedade civil, a fim de fortalecer as politicas públicas voltadas para a vida e os direitos das mulheres. Somente nos últimos três meses de 2023, lançamos onco editais, somando mais de R$ 15 milhões, focados em estruturar secretarias de Mulheres e Centros de Referência em todo o pais, financiar a compra de tornazeleras eletrônicas para agressores, investir em projetos de lavanderias públicas e estimular a capacitação em autonomia económica e empoderamento de mulheres

CGO Ministério das Mulheres está se empenhando em desenvolver ações conjuntas com grandes empresas de tecnologia para combater o discurso de ódio propagado em sites e canais que lucram com os ataques à dignidade das mulheres. É uma ação transversal, que já teve adesão de cerca de 139 empresas pridas e públicas, organizações e movimentos sociais, grupos religiosos, clubes e torcidas organizadas, além de governos e outros ministérios, como Cultura, Transportes e Esportes. Todos se comprometeram a realizar ações de enfrentamento à misoginia.

Além disso, é uma forma de pautar o debate na sociedade, estimular campanhas de utilidade pública sobre o tema, popularizar a palavra e fazer a sociedade compreender que a misoginia é a raiz de todas as formas de violência e desigualdades contra as mulheres.

RM O Supremo Tribunal Federal declarou inconstitucional o uso da tese da legitima defesa da honra em crimes de feminicidio ou de agressão contra mulheres. Como a senhora avalia esta decisão?

CG – A deosão do STF põe fim a esta argumentação que sempre foi inconstitucional, mas que era amplamente aceita nos tribunais em virtude da estrutura patriarcal e misõgina do Judiciáno e da nossa sociedade. Essa decisão é um passo no fortalecimento da democracia brasileira.

RM-De que forme o ambiente escolar pode contribuir na luta contra a misoginia?

CGO ambiente escolar repete as opressões existentes na nossa estrutura de sociedade, mas all o terreno é propício para o debate e o enfrentamento dos preconceitos, das discriminações e violências. As escolas precisam ser ambientes seguros para que meninas e meninos aprendam a reconhecer violações, violências e estejam munidas, especialmente elas, de ferramentas para enfrentá-las. Os meninos também devem ser ensinados a respeitar as diferenças e a reconhecer a igualdade de direitos.

A Ler Maria da Penha também estabelece que a tena seja amplamente discutido no ambiente escolar. É enganoso pensar que a escola não deve tratar de assuntos do cotidiano dos alunos, por vezes, essas meninas só terão na figura das professoras e professores a segurança necessária para romper com situações de abusos.

Recentemente, um estudo da Unicamp apontou que, de 36 ataques armados a escolas desde 2001 no Brasil, 100% dos autores eram homens e a maioria das vitimas (60%), mulheres. Em setembro de 2023, vero à tona um vídeo de alunos de Medicina da Universidade Santo Amaro (Unisa), em São Paulo, que chocou o Brasil e jamais pode ser normalizado os estudantes exibiram as partes intimas e fizeram atos obscenos durante um jogo de võles femenino. Isso deve ser combatido com o rigor da Lei, mas também por meio da educação, seja por protocolos e parceria com o Ministério da Educação, seja por meio de campanhas educativas.

MISOGINIA Segundo e dicionário Priberam, o significado de misoginia é: aversão ou desprezo pelos individuas do sexo feminino.

https://www.sintepiaui.org.br/noticia/2485-apos-anos-de-retrocesso-politico-e-aumento-no-numero-de-feminicidios-protecao-as-mulheres-vitimas-de-violencia-volta-a-ser-prioridade: CNTE/Brasil: Após anos de retrocesso…

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